Spring Breakers – Garotas Perigosas



Em seu texto para o Globe & Mail, o crítico Rick Groen se refere a Spring Breakers como “um artefato pop que expõe, e explora, a superficialidade dos artefatos pop”, e eu não acredito que alguém possa inventar melhor descrição. O devaneio em cores neon e suor etílico que Harmony Korine cria, usando inclusive ex-princesas da Disney em seu elenco como provocação sacramental, é tão delicioso quanto desagradável; e apesar de muito menos violento ou grotesco do que era de se esperar, tendo em vista o histórico do diretor, não deixa de ser um objeto bastante estranho. A trama é bastante simples, mas engana olhos menos atentos; pois apesar de parecer um videoclipe, a estrutura que realmente ecoa aqui é a de um reality show, em que a próxima eliminação é esperada como um grande evento; e isso fica bastante claro a cada vez que uma das quatro protagonistas abandona o grupo, para desaparecer como nunca tivesse existido. Korine faz crítica social, especialmente ao que a falta de atenção pode fazer com a mente de um jovem, passando muito longe do didatismo; coisa parecida vi recentemente no Paranoid Park de Gus Van Sant, e em Martha Marcy May Marlene, brilhante debut de Sean Durkin.

Por falar nelas, é pena, apesar de previsível, que as quatro garotas sejam o elo fraco da corrente. Além de enfrentarem um estupidamente sedutor James Franco numa desleal batalha de performances, é fato que Gomez, Hudgens, Benson e Korine -esposa do diretor- nunca foram conhecidas por serem grandes atrizes; mas há que ser reconhecida sua submissão ao texto, e principalmente, à câmera de Harmony. Excetuando a ingênua Faith, personagem que Selena Gomez constrói de maneira muito bonita e discreta no pouco tempo de tela que lhe cabe, as outras três moças são corpos febris, atraídos por sexo e álcool, quase sempre encobertos pelo neon da hipnótica fotografia de Benoît Debie. É divertido ver Vanessa Hudgens chegando tão longe por um papel; não esperava que ela fosse ter tamanha coragem de se expôr.

Não existe aqui uma investigação tão profunda do estranho e do absurdo, como Harmony havia feito em Gummo – Vida Sem Destino ou Trash Humpers, mas a imoralidade continua a ser tratada como uma honesta parcela do mundo em que vivemos. As primeiras cenas do filme são como um videoclipe de qualquer rapper norte-americano: moças e rapazes se enchendo de álcool e tirando as roupas numa praia, enquanto fazem gestos obscenos para a câmera. É a mais pura perversidade juvenil, tão conhecida pela comédia pastelão, mas tratada aqui com soturna seriedade; nada daquilo parece divertido ou sensual, é mais um presságio de que coisas vão dar errado muito em breve. A primeira aparição de Alien, o infantil e sexy gângster interpretado por Franco é desses momentos a que nenhuma importância é devidamente atribuída, e que revive como um respiro no momento em que ele surge discretamente no tribunal onde as mocinhas são julgadas, e responde com olhar faminto ao símbolo de uma arma sendo disparada, destinos estão sendo selados. O desenho de som tem papel importante e bastante curioso nessa construção; quase sempre ouvimos, em off, diálogos de momentos que ainda não aconteceram, mas que se explicarão em poucos instantes. Quando esse código é devidamente absorvido, o medo do que a próxima curva pode trazer se faz presente, mesmo que o filme seja uma linha reta.


Spring Breakers – Garotas Perigosas (★★★★)
Harmony Korine, Estados Unidos, 2012

IMDB ROTTEN KRITZ FILMOW