Videoclipes e Cineastas

Antes (algumas vezes depois) de se tornarem grandes cineastas, muitos diretores trabalham em outras searas, e durante os anos 90 e 2000 a área mais criativa e prolífica do mercado audiovisual era o videoclipe. Com a internet ainda sem grande alcance, criar versões visuais das músicas e exibir na tv aberta era uma fonte inesgotável de lucro para artistas e emissoras, e também se mostrou um valioso celeiro de realizadores. Abaixo eu compilo dez ótimos vídeos, que até hoje ressoam, seja na carreira desses cineastas, seja na cultura pop, ou mesmo na lembrança de quem acompanhou os tempos áureos desse tipo de mídia.

Arctic Monkeys – Cornerstone
Richard Ayoade, 2009
Richard Ayode é o que pode se chamar de alpinista audiovisual; ator da famosa série The I.T. Crowd, ele viu em sua amizade com Alex Turner uma maneira de contribuir na direção de alguns clipes da banda, que logo em seguida o catapultaram para o cinema. Até agora seus projetos não foram maravilhosamente sucedidos, e o que ficaram mesmo foram memórias de videoclips interessantíssimos, como o adorado Fluorescent Adolescent, e este Cornerstone, que causou furor à época do lançamento. Depois de tanto tempo lançando videos tão elaborados, fãs e crítica não conseguiram entender a brincadeira de filmar um único plano de Turner encarando a câmera e declamando a sentimental letra da música. É transgressor, para o meio em que está inserido, e maravilhosamente ridículo.

My Chemical Romance – Helena
Marc Webb, 2005
Certamente fresco nas lembranças de qualquer adolescente que viveu os anos 2000, o gótico e festivo velório de Helena era das coisas mais inusitadas a se ver na televisão àquela época. Filho primeiro da onda de emocore que dominava o mercado, o My Chemical Romance foi um pequeno fenômeno, e encontrou na parceria com Marc Webb a melhor maneira de transcrever suas músicas em imagem -que era algo descoordenada, diga-se. Dos mais populares diretores dos anos 2000, Webb acompanhou quase toda a carreira do MCR enquanto filmava também com Green Day, Good Charlotte e Hoobastank. Depois do enorme sucesso de (500) Dias Com Ela, sua estreia no cinema, virou o diretor da atual saga do Homem Aranha e anda com os bolsos cheios de dinheiro por aí.

Madonna – Vogue
David Fincher, 1990
Bem antes de ser o que é hoje em dia, David Fincher tinha a soberana majestade no reino dos videoclipes. Incessantemente requisitado durante os anos 80, trabalhando com nomes que iam desde os Gypsy Kings até o The Outfield, Fincher foi realizar um de seus mais potentes e lembrados trabalhos em 1990, quando dirigiu o eterno Vogue, de Madonna. Também no ápice da carreira, a cantora e o diretor colaboraram outras três vezes, mas nenhuma teve o impacto que a fotografia em preto e branco onírico e a coreografia de vogue dancing conseguiram alcançar. Imitado e referenciado até hoje, o vídeo (e a música) são parte muito importante na história da cultura pop.

The Chemical Brothers – Elektrobank
Spike Jonze, 1997
Ao lado de Michel Gondry, Jonze foi o mais respeitado e requisitado diretor dos anos 90, e tem clipes bem mais impressionantes que este no currículo, mas existe algo na construção visual de Elektrobank que, junto com a música do Chemical Brothers, faz o vídeo ser completamente hipnotizante. Seja a edição bastante precisa, a narrativa intencionalmente ridícula, ou o simples fato de ver uma jovem Sofia Coppola “praticando” saltos acrobáticos, o fato é que apesar de ter em si todo um espírito noventista, o clipe é bastante moderno para sua época.

Fiona Apple – Across The Universe
Paul Thomas Anderson, 1998
Fazer um cover de qualquer canção dos Beatles com intenções comerciais é certeza de estar mexendo em um vespeiro, mas felizmente Fiona Apple foi muito bem sucedida em sua adocicada releitura, que fazia parte da trilha sonora de Pleasantville – A Vida em Preto e Branco. Seguindo as ideias do filme, Apple se uniu pela primeira vez a Paul Thomas Anderson (numa parceria que segue até hoje), e criou um universo onde a cor também é vista como ameaça, e colocou a cantora para flutuar numa cafeteria interiorana, destruída por habitantes enfurecidos. O visual, a música, o conceito, e o olhar sempre esperto de PTA fazem o vídeo inesquecível, e indissociável da música.

Massive Attack – Protection
Michel Gondry, 1995
Da enorme coleção de trabalhos que Michel Gondry construiu, sendo um dos mais prolíficos diretores de videoclipe nos anos 90, é difícil separar um mais impressionante. Sempre afeito ao improviso e aos experimentos plásticos e visuais, sua colaboração com o Massive Attack ainda é intrigante hoje em dia. Gondry viaja através dos andares de um prédio contando pedaços das melancólicas vidas de seus moradores, e desafia algumas leis da gravidade para isso. Protection foi dos singles mais bem sucedidos da carreira do grupo, e o clipe ganhou um punhado de prêmios e indicações mundo afora.

DJ Shadow – Six Days
Wong Kar-Wai, 2002
Kar-Wai já era um diretor mais que respeitado e festejado quando aceitou dirigir este vídeo para o americano DJ Shadow. Amplamente conhecido por suas cores e tramas de romance, o taiwanês levou toda essa bagagem para o vídeo da música bastante climática de Shadow, e fez praticamente uma versão compacta de seus trabalhos no cinema. Six Days foi a terceira e última experiência de Kar-Wai em videoclipes, mas certamente um curioso exemplar de seus trabalho, e o melhor da videografia de Shadow.

Sonic Youth – Sunday
Harmony Korine, 2004
Combinar a estranheza da música do Sonic Youth com a estranheza do cinema de Harmony Korine era garantia de criar algo único, e o clipe de Sunday não falha em alcançar as expectativas. Basicamente uma compilação de Macaulay Culkin em câmera lenta e bailarinas em treino intenso, o vídeo era das coisas mais inexplicavelmente incômodas das madrugadas na MTV, e ainda hoje não perdeu essa potência. Além da direção de vídeos, Korine também se relaciona mais diretamente com a música, inclusive compondo junto a nomes como Björk e Lana Del Rey.

Bright Eyes – First Day Of My Life
John Cameron Mitchell, 2005
Um pouco antes da estreia de seu controverso Shortbus, John Cameron Mitchell dirigiu este clipe para o projeto Bright Eyes, do amigo Conor Oberst, e sem perceber (ou talvez percebendo) fez uma das mais simples e sensíveis peças de vídeo musical já vistas. Juntando amigos, desconhecidos, e não-atores que estrelariam o filme no ano seguinte, Mitchel simplesmente põe fones de ouvido nas pessoas, vira a câmera para elas, e deixa que a música faça o trabalho. As reações vão desde o amor infantil dos recém-namorados, até as lágrimas de alguém que já perdeu o parceiro. O vídeo foi amplamente premiado, e fez de First Day Of My Life a canção mais popular do Bright Eyes; além de ser uma curiosa introdução ao estudo sobre sentimentos que Shortbus se revelaria.

The White Stripes – I Just Don't Know What To Do With Myself
Sofia Coppola, 2003
Um dos campeões de lembranças quando se pensa nos clipes dos anos 2000, ou mesmo na carreira do White Stripes como um todo, a parceria do duo com uma ainda não tão festejada Sofia Coppola rendeu imagens inesquecíveis da modelo Kate Moss fazendo poses sensuais e praticando pole dance. O preto e branco granulado, e a desesperançosa letra da canção tiram bastante do olhar puramente sexy que poderia se jogar no vídeo, e garantem uma leitura bem mais melancólica daquelas imagens aparentemente tão simples e diretas. Pode ser um corpo relativamente estranho na videografia dos Stripes, mais afeitos aos experimentos visuais que faziam com Michel Gondry, mas certamente comporta toda a carga da música, e é um perfeito exemplar do trabalho que Sofia já realizava, e ia aprimorar bastante nos anos seguintes.

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